terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O CORTE DO ALFAIATE EM DOCUMENTÁRIO

O filme aborda o universo dos alfaiates

Uma imersão no mundo das alfaiatarias: seus personagens, suas histórias e seu ritmo próprio é, em resumo, a proposta do documentário O Corte do Alfaiate, realizado pelo fotógrafo e antropólogo João Castelo Branco, ao lado das antropólogas Valéria Oliveira Santos e Dayana Zdebsky de Cordova. O filme terá uma pré-estréia nesta quarta-feira, dia 8 de Dezembro. Na ocasião o público vai conhecer em primeira mão o resultado de uma pesquisa histórica e etnográfica que apresenta o universo de valores expresso no ambiente da alfaiataria e no fazer do alfaiate. O projeto foi realizado com apoio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, com o incentivo da Celepar e da Volvo do Brasil.
A idéia de realização do documentário surgiu no ano passado após a conclusão do livro Alfaiatarias em Curitiba realizado pela mesma equipe d’O Corte do Alfaiate. Naquela oportunidade os antropólogos perceberam que a riqueza abordada no livro poderia ser levada de forma diferente se eles filmassem aquele universo. Assim foi. Os pesquisadores explicam que o filme não é uma complementação do projeto anterior, mas, sim, uma nova abordagem daquilo que foi pesquisado no livro. “A forma é um agente dentro do projeto. Nós sabíamos que a técnica dos alfaiates foi uma questão que a gente abordou de uma forma diferente no livro e que poderia vir de volta no filme. Assim, há um outro foco também, porque o tipo de mídia utilizada acaba determinando os assuntos”, conta Dayana.
Para antropóloga Valéria Santos, no livro foi feita uma pesquisa sobre os alfaiates de Curitiba e agora eles trabalham com a técnica. Ela lembra que no livro o leitor não acompanhava o processo de realização de um terno. “Agora a gente acompanha desde o momento que o alfaiate desenha o terno no tecido, corta, até ele ficar pronto, mostrando diversas etapas, sem ser didático. Nossa intenção é transmitir para o público as habilidades que estão envolvidas nesse processo e que conteúdos dos alfaiates estão envolvidos na realização de um terno. Mostramos a técnica do fazer e como é difícil transmitir um universo de valores”. E aí que entram outros temas importantes como a relação do alfaiate com os clientes; o aprendizado; o impacto da alfaiataria na vida de cada um; e as trajetórias realizadas para se tornar alfaiate.

O documentário foi desenvolvido em sete alfaiatarias diferentes de Curitiba. Cada uma com sua característica. “Em algumas os alfaiates trabalham sozinhos em todos os processos; noutras eles têm a ajuda dos oficiais; no final percebemos que cada uma atende públicos distintos com ambientes que se diferenciam”, diz o João Castelo Branco. Para ele, o fato de o filme ter sido rodado em Curitiba não mostra uma realidade isolada. Pelo contrário. Revela que, apesar de algumas peculiaridades locais (como o êxodo rural no Paraná por conta da geada na década de 60), o resultado apresenta características comuns das alfaiatarias, não importa o local onde ela esteja. “Ser local ou não, fica bem dosado”, avalia.

Para o fotógrafo o documentário mostra uma atividade cosmopolita. A gente buscou informações em outras cidades do país e descobrimos que existem situações muito próximas. “O filme fala de uma temática que está se passando em todo o mundo. A alfaiataria como métier vive processos semelhantes. Há uma mudança de valores, da forma de se vestir, da roupa pronta, da estrutura de trabalho... isso tudo se modificou e em vários lugares as pessoas estão passando por isso. Os alfaiates falam das respostas que outras cidades estão dando e das dificuldades que têm de passar os seus conhecimentos para futuras gerações”.

Ao abordar o universo das alfaiatarias, os pesquisadores buscaram apresentar a realidade na sua forma mais fiel, com uma visão antropológica. Durante 70 minutos de filme, o que o espectador percebe é uma abordagem intimista, com o tempo próprio dos alfaiates. Sem narração. Os diálogos, espontâneos, são dos profissionais envolvidos no processo da alfaiataria. Eles conversam e se relacionam com a câmara. O som ambiente é da própria alfaiataria, sem trilha sonora. “Nós visitamos várias vezes as mesmas alfaiatarias em momentos diferentes. Foi um processo que permitiu a gente ter acesso a imagens muito particulares. O ritmo da alfaiataria é lento e as falas dão um ritmo. O filme tem uma linearidade temporal, mas o tempo não é contínuo”, lembra Dayana.

Ainda sobre a opção estética do documentário, Valéria diz que uma característica do filme é que ele não tem uma intenção jornalística, com informações mais rápidas e um panorama geral. Ela explica que a opção foi realizar um documentário sem ser excessivamente acadêmico. “Esteticamente também tivemos questões que são correlatas ao livro. Uma delas é a paisagem da alfaiataria que no filme foi representada por uma câmera aberta, fixa, onde está o movimento do alfaiate, mostrando suas ações. Quem assistir vai se sentir dentro de uma alfaiataria, observando tudo o que acontece no ambiente”.

João Castelo Branco conta a intenção é apresentar o que há de mais diverso no universo das alfaiatarias. “O caráter de proximidade com os alfaiates permitiu que a gente tirasse dessas situações expressões muito significativas da alfaiataria. Os alfaiates falam do modo de se vestir, do status da roupa sob medida, com tecido particular... e constatam que não falta trabalho e sim gente para trabalhar. Muitos lamentam a opção dos filhos que preferem fazer uma faculdade que ficar numa alfaiataria. Enfim, eles falam das mudanças nesse universo de valores. No final não há uma resposta sobre o futuro da alfaiataria, mas a certeza que ainda existe muita vida nesse processo”, conclui.

Serviço: O Corte do Alfaiate, documentário realizado por João Castelo Branco, Valéria Oliveira Santos e Dayana Zdebsky de Cordova. Pré estréia nesta quarta-feira, dia 8, às 20 horas, na Cinemateca de Curitiba na Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 1174 - Centro, Curitiba. Entrada franca.

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